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26 de Abril de 2024

Presidente e ex-presidente da República e o direito ao benefício da prisão especial

Publicado por Nadir Tarabori
há 6 anos

Muito se discutiu quanto a concessão do benefício do recolhimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em recinto semelhante a "sala especial do Estado Maior" para o início da execução provisória da sentença condenatória que lhe foi imposta pelo TRF4, de 12 anos e 1 mês de reclusão em regime fechado.

Em matéria publicada no último dia 6 de abril, no blog do jornalista Fausto Macedo, repórter do jornal O Estado de São Paulo, os promotores de justiça *Rogério Sanches Cunha e *Fernando Henrique de Araújo Moraes teceram algumas considerações a respeito deste assunto que intrigou a muitos.

Assim, pelo interesse da matéria, transcrevo a notícia ao colegas jus brasileiros.

A prisão especial está tratada no artigo 295, do Código de Processo Penal, que anuncia o rol de autoridades que têm direito ao benefício processual:

“Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva:

I – os ministros de Estado;

II – os governadores ou interventores de Estados, ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários e chefes de Polícia;

II – os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia;

III – os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados;

IV – os cidadãos inscritos no “Livro de Mérito”;

V – os oficiais das Forças Armadas e do Corpo de Bombeiros;

V – os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;

VI – os magistrados;

VII – os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República;

VIII – os ministros de confissão religiosa;

IX – os ministros do Tribunal de Contas;

X – os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função;

XI – os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos ou inativos.

XI – os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos.

§ 1º A prisão especial, prevista neste Código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum.

§ 2º Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento.

§ 3º A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana.”

Duas observações fundamentais devem ser apontadas:

1a.) a norma anuncia que “serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva”. Logo, o benefício só abrange prisão processual (não definitiva).

2a.) Percebe-se que no rol do art. 295, do CPP não estão previstas as figuras do Presidente e do ex-Presidente. Com relação ao primeiro, o silêncio tem motivo. A CF/88 veda a prisão provisória do Presidente da República, só admitindo a clausura após a decisão condenatória definitiva pelo STF (art. 86, § 3º).

E em se tratando de ex-Presidente? Cabe o benefício da prisão especial?

Em que pese a ausência da figura do ex-Presidente da República no dispositivo que autoriza prisão processual especial, deve ser lembrado que o rol nele previsto é meramente exemplificativo.

“A rigor, por se tratar de norma que, de alguma forma cria privilégios àqueles que se encontrem em alguma das situações abaixo, podendo violar o princípio da isonomia, que tem assento constitucional, a interpretação deveria ser restrita, não admitindo, assim, qualquer ampliação para outras hipóteses senão aquelas expressamente previstas neste dispositivo. Demais disso, se o legislador teve o cuidado de elencar diversas situações, pontuando cada uma delas, significa que, somente nelas, se admitiria a prisão especial. Tratar-se-ia, assim, de um rol taxativo, a não admitir, portanto, o favor legal fora daquelas hipóteses expressamente elencadas no dispositivo em exame.

Sucede que, após a edição do código, em 1941 e sua entrada em vigor no ano seguinte, foram tantas as leis esparsas, invariavelmente de cunho corporativo, que, individualmente, estenderam o mesmo benefício para seus membros que hoje, caso se pretendesse efetuar um levantamento dessa legislação, encontraríamos enorme dificuldade. O mais fácil seria o legislador indicar que tem direito ao favor legal as pessoas que indica, além daquelas apontadas em legislação extravagante.

De sorte que atualmente, sem qualquer titubeio, pode-se afirmar que o rol do artigo 295 e seus incisos é meramente exemplificativo, permitindo-se se estender o direito à prisão especial a inúmeras outras situações que não previstas no texto legal” (CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista. Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados – artigo por artigo. Salvador: Juspodivm, 2017. p. 772).

Vê-se, assim, campo fértil para que ex-Presidente da República tenha direito ao benefício.

Não apenas o rol meramente exemplificativo ancora essa conclusão, como também os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Qualquer cidadão que tenha ocupado o cargo de chefe máximo da República brasileira deve ter o direito ao benefício da prisão processual especial.

Por fim, pergunta-se: a execução penal provisória da pena deve respeitar o artigo 295 do Código de Processo Penal?

Entendemos que sim. O STF, em sede de controle concentrado de constitucionalidade, tendo como objeto o art. 283 do CPP, admitiu o início da execução da pena após o julgamento do recurso em segunda instância.

A decisão da mais alta Corte, porém, não enfrentou a natureza dessa prisão, ou seja, se definitiva ou cautelar.

Parece-nos que definitiva não é, pois está sujeita à reforma por meio de recurso constitucional.

Tampouco é cautelar, considerando que sua decretação não se mostra acessória, instrumental do processo, nos moldes do artigo 312 do Código de Processo Penal. Logo, pensamos ter sido criada uma terceira espécie de prisão, que denominamos prisão provisória não cautelar decorrente de acórdão de segundo grau.

*Rogério Sanches Cunha é professor de Direito e Processo Penal do CERS CONCURSOS; promotor de Justiça/SP.

* Fernando Henrique de Moraes Araújo é promotor de Justiça/SP; Mestre em Direito pela PUC-SP – 2007; professor Universitário da FIEO – Faculdade de Direito de Osasco e de cursos preparatórios para carreiras jurídicas.

Fonte: http://política.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/presidenteeex-presidente-da-republicaeo-direi...

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Nadir é Deus! continuar lendo

Além de não não esposar o entendimento festejado pelos promotores Rogério Sanches Cunha e Fernando Henrique de Moraes Araújo, faço duas ressalvas nas afirmativas dos ilustres membros do MP.

O STF não se manifestou, ainda, quanto a constitucionalidade do art. 283 do CPP, estando a matéria aguardando o julgamentos da ADC 43 e 44.

É equivocado o entendimento de que a CF em seu art. 86, § 3º só admite a clausura do presidente após a decisão condenatória definitiva. A mencionada norma exige apenas sentença condenatória, restando silente se é definitiva ou não. continuar lendo